Uma força-tarefa nacional com cerca de 1.400 agentes cumpre nesta quinta-feira (28) mandados de busca, apreensão e prisão em oito estados para desarticular um esquema criminoso bilionário no setor de combustíveis, comandado por integrantes da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC).
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A operação, batizada de Carbono Oculto, é considerada a maior da história do Brasil contra o crime organizado. O grupo é suspeito de sonegar mais de R$ 7,6 bilhões em impostos federais, estaduais e municipais, de acordo com autoridades da Fazenda de São Paulo.
A ação acontece em São Paulo, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Paraná, Rio de Janeiro e Santa Catarina e é resultado da junção de três operações, reunindo esforços do MP-SP, MPF, Polícia Federal, Civil e Militar.
Esquema criminoso e impactos
As investigações revelaram que o PCC atuava na importação irregular de produtos químicos para adulterar combustíveis, com fraudes identificadas em várias etapas da produção e distribuição de gasolina e etanol.
- Foram identificados mais de 300 postos de combustíveis envolvidos diretamente nas fraudes, e estima-se que 30% dos postos de São Paulo — cerca de 2.500 estabelecimentos — tenham sido afetados;
- Consumidores eram lesados de duas formas:
- Fraude quantitativa: pagando por volumes inferiores ao indicado nas bombas;
- Fraude qualitativa: adquirindo combustíveis adulterados fora das especificações técnicas exigidas pela ANP;
- Proprietários de postos vendidos à rede criminosa não receberam os valores das transações e foram ameaçados de morte.
Segundo o MP-SP, os recursos obtidos com essas infrações eram realocados em uma complexa rede de pessoas interpostas, shell companies, fundos de investimento e fintechs, ocultando os verdadeiros beneficiários. Parte desses recursos foi utilizada para comprar usinas sucroalcooleiras, distribuidoras, transportadoras e postos de combustíveis.
Fintechs e fundos de investimento utilizados pelo PCC
O PCC utilizava fintechs e fundos de investimento como instrumentos centrais da lavagem de dinheiro:
- Ao menos 40 fundos de investimento foram identificados, com patrimônio de R$ 30 bilhões, usados para adquirir empresas, usinas, imóveis e blindar patrimônio;
- As fintechs operavam com contabilidade paralela e contas-bolsão, dificultando o rastreamento de valores e ocultando os beneficiários finais;
- Os fundos permitiram a aquisição de um terminal portuário, usinas de álcool, fazendas no interior de São Paulo, 1.600 caminhões e imóveis de luxo, incluindo uma casa em Trancoso/BA;
- O uso de instituições de pagamento em vez de bancos tradicionais tinha como objetivo burlar a fiscalização da Receita Federal e das autoridades financeiras.
Principais empresas investigadas
- Grupo Aster/Copape: controlam usinas, distribuidoras, formuladoras e uma rede de postos utilizada pelo PCC;
- BK Bank: fintech usada para movimentar dinheiro por meio de contas-bolsão não rastreáveis;
- Reag: fundo de investimento utilizado para compra de empresas, usinas e blindagem patrimonial.

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Funcionamento do esquema: metanol e adulteração
- Um dos eixos principais da fraude envolvia a importação irregular de metanol, solvente altamente inflamável e tóxico, pelo Porto de Paranaguá (PR);
- O produto era desviado com documentação fraudulenta, colocado clandestinamente em postos e distribuidoras, adulterando combustíveis;
- A prática gerava lucros bilionários, mas representava risco ao meio ambiente e à segurança de motoristas e pedestres;
- Metanol em combustíveis pode corroer peças e causar falhas nos motores, alertam especialistas.
Recuperação de tributos e monitoramento
O Comitê Interinstitucional de Recuperação de Ativos do Estado de São Paulo (CIRA/SP) vai solicitar bloqueio de bens para recuperar o tributo sonegado, cujo montante atualizado é R$ 7.672.938.883,21.
- As fintechs e instituições financeiras digitais agora serão monitoradas detalhadamente, enviando informações à Receita Federal como os grandes bancos, após decisão do ministro da Fazenda, Fernando Haddad;
- A medida visa reforçar a fiscalização e a parceria com a Polícia Federal para combater esquemas sofisticados de lavagem de dinheiro.
Participação das autoridades
A ação é coordenada pelo MP-SP, por meio do Gaeco, e conta com apoio do MPF, Polícia Federal, Civil e Militar, além da Receita Federal, Secretaria da Fazenda de SP, ANP e PGE-SP. Ministérios Públicos de outros estados também participam do cumprimento dos mandados.
Ao todo, mais de 350 alvos — pessoas físicas e jurídicas — são investigados por crimes contra a ordem econômica, adulteração de combustíveis, crimes ambientais, fraude fiscal, lavagem de dinheiro e estelionato.
A Operação Carbono Oculto evidencia a sofisticação financeira do PCC, mostrando como o crime organizado explorava fintechs, fundos de investimento e shell companies para movimentar bilhões e expandir sua atuação no setor de combustíveis, afetando consumidores, empresários e toda a cadeia econômica.