A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu nesta quarta-feira (12) o julgamento dos chamados “kids pretos”, grupo de militares acusados de planejar o monitoramento e o assassinato de autoridades, incluindo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o próprio ministro Alexandre de Moraes.
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O caso, que faz parte do inquérito sobre a organização criminosa criada para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro no poder após a derrota nas urnas em 2022, será retomado na próxima terça-feira (18), quando os ministros apresentarão seus votos pela absolvição ou condenação dos dez réus.
O primeiro a votar será o relator Alexandre de Moraes, seguido por Cristiano Zanin, Cármen Lúcia e Flávio Dino, atual presidente da Turma.
Clima tenso marcou o segundo dia de julgamento
O segundo dia do julgamento foi marcado por tensões entre defesa e ministros, sobretudo após as cobranças de Flávio Dino por respeito e lealdade institucional.
Durante a sessão, Moraes questionou as provas apresentadas pelas defesas, que negaram qualquer envolvimento dos militares no suposto plano para assassinar autoridades ou pressionar o alto comando do Exército a aderir a uma tentativa de golpe.
O primeiro a falar foi o advogado Jeffrey Chiquini da Costa, representante do tenente-coronel Rodrigo Bezerra de Azevedo, que está preso e acompanhou parte da sessão presencialmente. A defesa pediu absolvição total do militar.

“Azevedo, que a acusação coloca como liderança de monitoramento, não participou das reuniões. Ministro presidente, veja só a insanidade acusatória: como um tenente-coronel que seria líder não participa das reuniões de planejamento? Não faz sentido”, declarou o advogado.
Segundo ele, Azevedo não participou do plano denominado “Punhal Verde-Amarelo”, supostamente elaborado para eliminar autoridades.
Debate sobre provas e questionamentos de Moraes
A defesa apresentou fotos do aniversário do réu como tentativa de comprovar que ele não participou das ações em uma das datas citadas na denúncia. Moraes, no entanto, questionou a ausência de registros do próprio dia 15, quando a Procuradoria-Geral da República (PGR) afirma que o grupo monitorou o ministro.
“Juntou foto do clube, parece, é do réu na piscina. Há fotos do dia 14 e do dia 12, mas não teria uma foto do dia do aniversário? Todos nós tiramos fotos nesse dia”, provocou Moraes.
O advogado respondeu:
“Mas vossa excelência tira com o seu próprio celular. O aparelho do meu cliente foi apreendido.”
Moraes insistiu se não haveria registros feitos pela família, o que levou o advogado a reagir:
“Excelência, essa pergunta é maravilhosa. Vamos suspender o julgamento e solicitar o laudo de extração do celular do coronel. Assim, todos tiraremos essa conclusão. Não tivemos acesso a esse laudo, que está com a Polícia Federal.”

Críticas à investigação e reação do ministro Flávio Dino
Durante sua sustentação, o advogado também criticou as investigações da PGR, alegando falta de acesso às provas e questionando a atuação do subprocurador-geral Paulo Jacobina.
A fala provocou reação imediata do ministro Flávio Dino, que pediu respeito à Corte e à liturgia do cargo.
“Esta não é uma tribuna parlamentar. O tribunal tem sido leal com a advocacia brasileira, e reivindicamos o mesmo respeito — dentro e fora deste plenário”, afirmou Dino, em tom firme.
O presidente da Turma destacou ainda que o STF tem dado amplo espaço às defesas, inclusive para pedidos de absolvição e redução de penas, mas reforçou que o respeito institucional é um dever legal.
“Sabemos nosso papel e o fazemos com serenidade e equilíbrio. O tribunal é, por lei, destinatário de respeito, assim como o é em relação às partes”, completou.
Defesas negam participação em qualquer trama golpista
Na sequência, os advogados dos tenentes-coronéis Ronald Ferreira e Sérgio Cavalierri negaram que seus clientes fizessem parte de forças especiais ou integrassem o grupo dos ‘kids pretos’.
Segundo a PGR, Ronald teve participação pontual, sendo acusado de incitação ao crime. Seu advogado, João Carlos Dalmagro Júnior, sustentou:
“O coronel Ronald não é ‘kid preto’ e jamais planejou qualquer ação contra o Estado Democrático de Direito. Não participou de reuniões, não organizou eventos, não fez parte de qualquer estrutura criminosa.”
Já o advogado Igor Laboissieri Vasconcelos Lima, defensor de Cavalierri, chamou atenção ao fazer uma referência literária a “Senhor dos Anéis” para ilustrar a luta entre luz e trevas dentro das instituições, numa metáfora sobre justiça e poder.
O julgamento será retomado na próxima terça-feira (18) com o voto do relator Alexandre de Moraes, que deverá definir a linha de entendimento da Turma sobre o envolvimento dos militares no suposto plano golpista.
Até lá, o caso segue como um dos mais emblemáticos da investigação sobre a tentativa de ruptura institucional e pode definir novos rumos nas punições aos envolvidos no chamado “núcleo 3” da organização criminosa.
Como resumiu um ministro ao fim da sessão: “Não se trata apenas de um julgamento de pessoas, mas de um teste sobre a própria força das instituições democráticas.”









