O Primeiro Comando da Capital (PCC) consolidou sua atuação no litoral paulista com foco em um objetivo estratégico: controlar o Porto de Santos. Para a facção, o local é a principal porta de saída da cocaína para o exterior e funciona como se fosse o centro de uma “empresa de logística do crime”, segundo análise de Rafael Alcadipani, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP) e pesquisador em Segurança Pública.
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Em entrevista recente, concedida à GloboNews, Alcadipani destacou que o avanço da organização criminosa não pode ser tratado como um fenômeno local, mas sim como um problema nacional de segurança e de soberania.
“O PCC atua como uma empresa que organiza o transporte internacional de drogas. Dominar o litoral sul de São Paulo é vital. Por isso, é urgente realizar uma verdadeira desocupação criminal desse território”, afirmou.
O debate sobre a força das facções ganhou mais destaque após o assassinato do ex-delegado-geral de São Paulo, Ruy Ferraz Fontes, em Praia Grande. A Polícia Civil já identificou dois suspeitos de envolvimento na execução.
O crime levou o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, a classificá-lo como “brutal”, além de oferecer apoio de forças federais para ajudar nas investigações.
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Fontes, que durante anos esteve na linha de frente contra o crime organizado, chegou a relatar que vivia sem proteção mesmo após deixar o comando da polícia, situação que expôs a falta de políticas permanentes para quem enfrenta facções de forma direta.
Alcadipani ressaltou que o Brasil ainda não estruturou mecanismos para proteger juízes, promotores e policiais que combateram o crime organizado e se aposentaram.
“Estamos vendo a primeira geração de autoridades que enfrentaram o crime organizado chegar à aposentadoria. Diferente de países como o Chile, que garantem proteção a quem esteve exposto, o Brasil ainda não criou nenhuma política nesse sentido. Isso já deveria estar em vigor”, avaliou.
Outro ponto defendido pelo especialista é a criação de uma entidade nacional dedicada ao enfrentamento das facções, uma espécie de ‘autoridade antimáfia’.
A ideia é centralizar informações e operações de diferentes instituições — como polícias e Receita Federal — evitando a disputa por protagonismo que, segundo Alcadipani, enfraquece o combate ao narcotráfico.
“Não dá para cada órgão querer agir isoladamente. Uma autoridade antimáfia teria a função de integrar essas agências e coordenar esforços de forma mais profissional e efetiva”, explicou.
O Porto de Santos, maior da América Latina, continua sendo o grande trunfo do PCC, que utiliza sua infraestrutura como rota internacional para o tráfico. Para especialistas, apenas uma resposta de Estado, integrada e permanente, poderá reduzir o poder da facção.
As medidas defendidas por Alcadipani incluem:
- Retomada do litoral com uma desocupação criminal organizada;
- Criação de leis que assegurem proteção vitalícia a autoridades expostas ao crime organizado;
- Formação de uma autoridade antimáfia para coordenar instituições e tornar o combate mais profissional.
A avaliação do professor revela que o Brasil enfrenta um momento decisivo no enfrentamento às facções criminosas. Sem mudanças estruturais, alerta ele, o PCC continuará expandindo sua influência a partir de um dos portos mais importantes do mundo.