O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) protagonizou nesta quinta-feira (3) um gesto político de forte simbolismo ao visitar a ex-presidente argentina Cristina Kirchner, que cumpre prisão domiciliar por condenação em um esquema de corrupção. O encontro ocorreu em Buenos Aires, na residência onde Cristina está detida, e durou aproximadamente 50 minutos.
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Ao final da visita, Lula posou para fotos segurando um cartaz com os dizeres “Cristina Livre”, em uma manifestação pública de apoio à antiga aliada. A imagem foi divulgada nas redes sociais pelo escultor argentino Adolfo Pérez Esquivel, vencedor do Prêmio Nobel da Paz de 1980. Ao lado de Lula, o deputado argentino Eduardo Valdés, da coalizão peronista União pela Pátria, segurava outro cartaz, que dizia “Lula Livre”.
“Cristina é inocente. Se caíram as mentiras contra Lula no Brasil, elas vão cair aqui também”, afirmou Esquivel, denunciando o que chamou de continuidade da prática de lawfare — o uso do sistema de Justiça para fins políticos — na América Latina.
Reencontro entre aliados e críticas ao Judiciário
Após o encontro, Lula publicou uma mensagem em suas redes sociais reforçando a relação de amizade com Cristina e prestando solidariedade à ex-presidente argentina.
“Tenho por Cristina uma amizade de muitos anos que vai além da relação institucional. Um carinho e afeto de amigos, companheiros de campo político e de ideais de justiça social e combate às desigualdades”, escreveu Lula.
Embora não tenha defendido diretamente a libertação de Cristina, o presidente brasileiro destacou a importância da mobilização popular em momentos difíceis e disse ter sentido nas ruas o apoio que a ex-presidente ainda recebe de parte da população argentina.
Cristina agradece e se compara a Lula
Cristina Kirchner também comentou o encontro em suas redes sociais. Ela classificou a visita como um “ato político de solidariedade”, agradeceu o apoio de Lula e afirmou que é vítima de perseguição judicial.
“Lula também foi perseguido, usaram lawfare para prendê-lo e tentaram silenciá-lo. Não conseguiram. Ele voltou com o voto do povo brasileiro e de cabeça erguida”, escreveu.

A ex-presidente acusou o Poder Judiciário argentino de atuar politicamente, servindo aos interesses do “poder econômico”, e reiterou que sua condenação foi parte de um processo conduzido com parcialidade.
Entenda o caso: condenação por corrupção
Cristina Kirchner foi condenada por favorecimento em licitações públicas ao empresário Lázaro Báez, amigo pessoal da família Kirchner. Segundo o Ministério Público, entre os anos de 2003 e 2015, a empreiteira de Báez venceu 51 contratos de obras públicas, muitos dos quais superfaturados ou jamais concluídos.
A acusação afirma que os recursos desviados retornavam à família Kirchner, por meio de empresas de fachada, em um esquema que teria causado prejuízo de mais de US$ 1 bilhão ao erário argentino.

Cristina foi sentenciada por chefiar uma organização criminosa e por administração fraudulenta, abrangendo os governos de seu marido, Néstor Kirchner (2003-2007), e os dois mandatos dela mesma (2007-2015). Ela nega todas as acusações e afirma que a sentença foi definida antes mesmo do julgamento.
Tensão política entre peronismo e governo Milei
O gesto de Lula ocorre em um momento de crescente polarização na Argentina, sob o governo do presidente Javier Milei, adversário declarado do kirchnerismo. Cristina utilizou suas redes sociais para denunciar o que chamou de “medidas autoritárias” adotadas pelo atual governo, reforçando a narrativa de perseguição política.

A visita de Lula reacende o debate sobre instrumentalização do Judiciário em disputas políticas na América do Sul. Tanto o caso de Cristina quanto o histórico recente de Lula — que passou 580 dias preso até a anulação de suas condenações pela Operação Lava Jato — são frequentemente citados por líderes progressistas como exemplos de lawfare.
O apoio público de Lula fortalece a frente política da esquerda sul-americana, que busca reconstruir sua base regional diante da ascensão de governos liberais e conservadores. O gesto é visto também como uma tentativa de reposicionar o Brasil como liderança diplomática no continente.