Durante uma coletiva de imprensa em Jacarta, na Indonésia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta sexta-feira (24) que “traficantes de drogas são vítimas dos usuários”, ao comentar o combate ao tráfico e responder a uma pergunta sobre as recentes declarações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que tem defendido ações militares letais contra grupos de narcotráfico fora do território norte-americano.
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“Toda vez que a gente fala de combater as drogas, possivelmente fosse mais fácil a gente combater os nossos viciados internamente. Os usuários são responsáveis pelos traficantes, que são vítimas dos usuários também. Você tem uma troca: gente que vende porque tem gente que compra. Então é preciso que a gente tenha mais cuidado no combate à droga”, declarou Lula.
A fala, feita em meio a discussões diplomáticas sobre segurança e tráfico internacional, rapidamente repercutiu negativamente, sendo utilizada por setores da oposição como crítica à condução do governo nas políticas de segurança pública.
Crítica indireta a Trump
Sem mencionar diretamente o presidente norte-americano, Lula também criticou a possibilidade de execuções extrajudiciais de pessoas acusadas de tráfico e defendeu que líderes internacionais ajam com responsabilidade.
“Você não está aí para matar as pessoas, você está para prender as pessoas. Antes de punir alguém, é preciso julgar, ter provas. Você não pode simplesmente dizer que vai invadir o território de outro país. É preciso respeitar a Constituição, a autodeterminação dos povos e a soberania territorial”, afirmou.
O presidente brasileiro ressaltou que o Brasil tem atuado no combate ao narcotráfico por meio de operações coordenadas com a Polícia Federal e cooperação internacional, destacando o papel da Interpol e de parcerias bilaterais.
“Estamos trabalhando com outros países, com a Interpol e forças policiais para combater o narcotráfico, o tráfico de armas e o contrabando. É melhor trabalhar em parceria do que cada país decidir agir sozinho”, disse Lula.
As declarações ocorreram em meio à escalada de tensões diplomáticas entre Estados Unidos e Venezuela, após Trump declarar que “não precisa de declaração de guerra” para autorizar operações militares contra supostos traficantes de drogas. O ex-presidente norte-americano comparou cartéis latino-americanos ao Estado Islâmico e reafirmou que pretende “erradicar totalmente o narcotráfico”.
Retratação e esclarecimento
Horas após a repercussão, Lula se retratou nas redes sociais, reconhecendo que a frase sobre os traficantes foi “mal colocada” e reafirmando sua posição contrária ao crime organizado.
“Fiz uma frase mal colocada nesta quinta e quero dizer que meu posicionamento é muito claro contra os traficantes e o crime organizado”, escreveu o presidente.
Na mensagem, Lula afirmou que “mais do que palavras, são as ações” do governo que demonstram o compromisso com a segurança pública e o combate às drogas.
“Mais importante do que as palavras são as ações que o meu governo vem realizando, como é o caso da maior operação da história contra o crime organizado, o encaminhamento ao Congresso da PEC da Segurança Pública e os recordes na apreensão de drogas no país”, destacou. “Continuaremos firmes no enfrentamento ao tráfico de drogas e ao crime organizado.”
Lula também mencionou a Operação Carbono Oculto, conduzida pela Polícia Federal, que desarticulou um esquema bilionário no setor de combustíveis controlado por integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC).
Contexto internacional e encontro com Trump
O episódio ocorre às vésperas de um encontro entre Lula e Donald Trump, previsto para domingo (26), durante uma agenda paralela à cúpula do sudeste asiático. Segundo o governo brasileiro, o encontro deve funcionar como um “quebra-gelo” diplomático após meses de tensão econômica e política entre os dois países.
“Não há assunto proibido entre nós. Estou aberto a discutir qualquer tema com o presidente Trump”, disse Lula a jornalistas.
Será o primeiro encontro oficial entre ambos desde a crise provocada pelo tarifaço de 50% imposto pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros. Até o momento, Lula e Trump haviam mantido apenas contatos telefônicos e uma breve conversa durante a Assembleia Geral das Nações Unidas, em setembro, quando o norte-americano afirmou ter tido uma “química excelente” com o presidente brasileiro.
Com a polêmica declaração e a rápida retratação, Lula tenta equilibrar o discurso entre firmeza no combate ao tráfico e defesa dos direitos humanos, ao mesmo tempo em que se posiciona contra a retórica militarista de Trump. O episódio evidencia a delicadeza das discussões sobre segurança internacional e reforça o esforço do governo brasileiro em buscar soluções multilaterais e diplomáticas para enfrentar o narcotráfico global.









