Lula reage à derrota sobre o IOF e defende justiça tributária em meio a tensão institucional

Em meio a uma das mais expressivas derrotas do governo no Congresso Nacional, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o “Brasil começa a ser justo pela tributação”. A declaração foi feita em 30 de junho, poucos dias após o Legislativo derrubar os decretos que elevavam as alíquotas do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), uma medida que, segundo o Palácio do Planalto, visava à promoção da justiça fiscal e à recomposição de receitas.

A fala do presidente simboliza uma tentativa de recompor a narrativa política em meio à crescente pressão por equilíbrio fiscal e articulação institucional. Porém, a reação imediata do governo à derrota, incluindo o ajuizamento de uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF), ampliou o atrito entre Executivo e Congresso e colocou à prova a estratégia de governabilidade para o segundo semestre.

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O revés ocorreu no dia 25 de junho, quando 383 deputados federais votaram pela derrubada dos decretos do IOF. No Senado, a votação simbólica confirmou o resultado. Com isso, o governo perdeu a autorização para elevar alíquotas incidentes sobre operações financeiras de maior valor, como câmbio, aplicações em renda fixa e crédito corporativo. A equipe econômica estimava que a medida geraria até R$ 12 bilhões em 2025 e mais de R$ 20 bilhões no ano seguinte.

O Ministério da Fazenda defendia o reajuste como uma medida de justiça tributária, ao atingir segmentos com maior capacidade contributiva. Mas parlamentares da oposição e do chamado Centrão classificaram o aumento como uma ação unilateral, sem diálogo prévio com as lideranças da Câmara e do Senado.

Já, a reação do Planalto foi rápida e em múltiplas frentes. Em pronunciamentos públicos e redes sociais, Lula reiterou o argumento de que a medida visava redistribuir recursos da elite para os mais pobres. Aumentos anteriores no salário mínimo, a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, o Vale Gás e a Tarifa Social de Energia foram usados como exemplos de políticas de inclusão financiadas por impostos mais progressivos.

Paralelamente, a Advocacia-Geral da União (AGU) ingressou com uma ação direta de inconstitucionalidade no STF, alegando que o Congresso extrapolou suas competências ao revogar decretos que, por lei, cabem exclusivamente ao Executivo. O advogado-geral Jorge Messias afirmou que houve uma “invasão de atribuições presidenciais”, o que provocou reações duras do Legislativo.

A ofensiva judicial não foi bem recebida pelo Congresso. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), declarou que alertou previamente o governo sobre a inviabilidade da proposta e rebateu as críticas com uma metáfora.

“Capitão que vê o barco indo para o iceberg e não avisa não é leal, é cúmplice.” A declaração evidenciou o clima de desgaste entre os Poderes.

Nos bastidores, líderes partidários demonstraram preocupação com o agravamento da crise. A avaliação predominante é que o enfrentamento direto ao Legislativo, via Supremo, pode minar o apoio necessário para aprovar outras pautas relevantes, como a reforma tributária complementar e o arcabouço fiscal revisado.

Dentro do Partido dos Trabalhadores (PT), a derrota sobre o IOF foi convertida em combustível para reforçar o discurso de luta de classes. O líder da bancada na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ), acusou parlamentares de formarem uma “coalizão contra o povo” e de defenderem os interesses do setor financeiro. A estratégia, segundo analistas, mira consolidar uma base popular em torno do governo e preparar o terreno para 2026.

Ao mesmo tempo, o episódio expôs um impasse fiscal. Com juros básicos em 15%, inflação sob pressão e o desafio de cumprir a meta de déficit primário zero, o ministro Fernando Haddad já admite cortes de gastos e revisão de subsídios como alternativa para compensar a perda de arrecadação.

A declaração de Lula não foi apenas uma defesa do aumento do IOF, mas um movimento estratégico para reposicionar o governo diante de uma derrota política de grandes proporções. Ao transformar o tributo em símbolo de “justiça tributária”, o Planalto busca reposicionar o debate público, mas enfrenta o risco de isolamento no Congresso, desgaste institucional e instabilidade fiscal.

A judicialização, ainda que juridicamente plausível, pode levar meses para ser julgada pelo STF, prolongando a indefinição sobre a arrecadação e gerando ruído entre os Poderes. Resta saber se o governo conseguirá transformar a retórica em acordos concretos, ou se a crise marcará o início de um novo ciclo de paralisia decisória em Brasília.

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