José “Pepe” Mujica carregou no corpo as cicatrizes da repressão e, na alma, uma fé inabalável no poder do povo. Ex-guerrilheiro dos Tupamaros, grupo de resistência armado contra a ditadura uruguaia nas décadas de 1960 e 1970, Mujica passou 13 anos preso em condições desumanas, boa parte deles em solitárias. Sobreviveu à tortura, à fome e ao isolamento. Mas, ao deixar a prisão, escolheu não o caminho da vingança e sim da democracia, do diálogo e da reconstrução.
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Sua trajetória política floresceu na redemocratização. Mujica foi deputado, senador, ministro da Agricultura e, entre 2010 e 2015, presidente do Uruguai. Durante seu mandato, promoveu reformas ousadas que colocaram o país na vanguarda mundial: legalizou o aborto, o casamento entre pessoas do mesmo sexo e regulou o cultivo e a venda da maconha. Tudo isso enquanto governava com os pés no chão .
Recusou luxos, morou com sua esposa Lucía Topolansky numa chácara modesta nos arredores de Montevidéu e dirigia seu famoso Fusca azul. Doava grande parte de seu salário à caridade e, mesmo no cargo mais alto da nação, nunca se afastou da vida simples. Tornou-se conhecido como “o presidente mais pobre do mundo”, mas, para muitos, foi o mais rico em humanidade, coerência e compaixão.
A morte de José Mujica, aos 89 anos, representa uma perda profunda para o Uruguai e para todos que viam nele um símbolo de esperança em tempos de descrença política. A notícia gerou comoção imediata: flores, cartas e bandeiras se acumulam nas ruas de Montevidéu, em frente à sua antiga casa e à sede do governo. Cidadãos emocionados recordam discursos, gestos e momentos em que Mujica, com sua fala pausada e seu olhar cansado, os fez acreditar que outro tipo de liderança era possível.
O Uruguai está de luto não apenas pela perda de um ex-presidente, mas pela partida de uma figura que se tornou parte do imaginário coletivo. Mujica era mais do que político: era conselheiro, pensador, símbolo. Sua vida foi marcada por coerência rara, pela entrega ao bem comum e pela capacidade de transformar sofrimento em sabedoria.
Seu legado é eterno nos corações de todos os seus admiradoras. Fica o exemplo de que é possível resistir sem ódio, governar sem ostentação, servir sem se servir. Mujica fez da política um ato de amor e por isso seu nome será lembrado não apenas nos livros de história, mas nos corações de povos diversos.