“Vivian! Vivian
As estrelas brilham como nós!”
Tive oportunidade de conversar com Vivian Seixas, a filha caçula de Raul Seixas, por telefone. Consegui o seu contato através de sua produtora, a qual o telefone estava disponível na internet. A princípio, achei que iria falar diretamente com Vivi, mas ao explicar o intuito de minha ligação, sua empresária logo me passou o seu contato.
Vivi me respondeu prontamente, com muita simpatia e atenção, e logo topou participar da entrevista, descrita na íntegra logo abaixo. Com ela, descobri um estilo de música, o qual com sua criação em cima das letras de Raul, me arrepiou os pelos do corpo, tamanha originalidade, com uma musicalidade espetacular. Não podia ser diferente, visto o DNA de seu pai impregnado em seus genes, e a expressão gênica musical passada de Raulzito. Mendel explica!
Ricardo Lacava: Vivi, você decidiu seguir o caminho da música eletrônica, em 1998, quando na Austrália, você começou a participar de alguns festivais de Trance. Quase vinte anos depois, você foi escolhida como a melhor DJ feminina de Deep House, no DJ Sound Award 2015, mesmo ano que você chegou a abrir um show do Chemical Brothers. Queria que você contasse para essa galera um pouco dessa sua trajetória e explicasse também um pouco dessas vertentes da música eletrônica, como House, Funk and Techno House… Então dá uma clareada aí pra galera, conta um pouco dessa sua história.
Vivi Seixas: Salve, salve. Prazer estar aqui participando deste programa Plunct, Plact, Zum. Muito obrigada pelo convite. Um salve aí para toda galera raulseixista que está nos escutando. Bom, esse ano eu faço vinte anos de carreira. Está sendo um ano, assim, que eu tenho revisto minhas fotos de quando comecei a tocar. Tá sendo um momento bem nostálgico, né? E até essas surpresas, de como que a vida passa rápido. Bom, então, foi em 98, como você comentou, que eu fui ao meu primeiro festival de música eletrônica. Eu estava nos meus vinte anos, aos meus dezoito anos, e nessa época era remadora. Eu era atleta de remo do Clube de Regatas Botafogo, e adolescente, vivendo aquela minha crise existencial que quase toda adolescente passa, ainda mais com um pai tão genial como o meu, né? Me questionando “Meu Deus, o que que eu vou fazer aqui nesse planeta Terra? Qual é o meu dom?”. E quando eu fui fazer essa viagem de intercâmbio pra Austrália, eu fui no meu primeiro festival, e me encantei com aquele universo, porque até então eu conhecia… (pausa) …eu sempre gostei de dançar, eu sempre gostei de música, mas eu conhecia, eu ia pra balada, eu ia pra boate, lugar fechado, né? E quando eu descobri aquele universo das pessoas dançando ao ar livre, na natureza, com o pé no chão – eu sempre fui muito conectada com a natureza -, ali o bichinho me mordeu. Eu voltei pro Brasil, comecei a frequentar os festivais de trance daqui. Festivais bem famosos, como Transcendence, que ficava na Chapada dos Veadeiros, Transfusion que era em Quirinópolis, em Goiás. E lá rolava muito trance. Mas o trance, eu vou dar uma explicada breve para vocês. O Trance é um estilo de música eletrônica bem acelerado, com bastante psicodelia e é originário de Goa, na Índia. Então o nome trance é como se você entrasse em transe mesmo, porque o som é uma batida assim, bem repetitiva e bem psicodélica. Então esses festivais aqui no Brasil eram festivais de trance, mas eu fui conhecer a House Music, e a House Music, pra explicar para os leigos, seria um filho da Disco Music, né? Então, dentro da House Music existem várias vertentes. Existe o Funk House, como você falou. E o funk não é do funk brasileiro, é do funk americano, então é um som com umas linhas de baixo bem funkeadas nessa pegada do funk americano. E aí eu conheci esse estilo. E aí que me apaixonei e encontrei o meu nicho na música eletrônica… eu encontrei o meu nicho. É claro que tinha muitas pessoas me questionando, como que a filha do Raul… quando vai tocar guitarra, não vai cantar, não vai compor isso? Isso, na época que eu era uma adolescente, me deixou bem insegura, né? Mas eu olhando pra trás hoje em dia e completando esses vinte anos de carreira, tendo sido tão reconhecida pelo meu trabalho, que eu acho que isso é muito importante… eu acho que eu fui muito corajosa, sabe, de ter seguido meu caminho e acreditado no meu sonho.
Ricardo Lacava: Vivi, é verdade que você largou a faculdade de turismo pra seguir a carreira de DJ? O que sua família achou disso na época? Quantos anos você tinha? Conta um pouco pra gente.
Vivi Seixas: Sim, eu larguei não só a faculdade de turismo, quanto a faculdade de publicidade e propaganda. É engraçado que a única coisa que minha mãe me pedia era “minha filha, termine uma faculdade”. Mas quando eu descobri esse meu dom pra discotecagem, quando eu comecei a trabalhar… Trabalhar, né? Porque é muita contradição. Algumas pessoas dizem que DJ não é trabalho… É trabalho, sim! Quando eu comecei a trabalhar e viajar o Brasil inteiro tocando e fazendo meu dinheiro, fazendo meu nome, eu senti que eu estava perdendo tempo ali na faculdade, estava perdendo tempo e estava jogando dinheiro fora numa coisa que eu sabia que não ia fazer. Porém, a faculdade de publicidade e propaganda me trouxe um background bem legal. Bem legal pra saber me vender, né? Porque todos somos um produto, né? Então, foi bem bacana. Me arrependo de não ter terminado a faculdade de publicidade propaganda, mas nunca é tarde demais pra começar tudo de novo.
Ricardo Lacava: Vivi, apesar de ser filha de Raul Seixas, você conquistou seu espaço no cenário musical sem ter que usar essa alcunha de ser filha de Raulzito. Até mesmo porque são estilos musicais bem distintos. Após anos de experiência e noites sem dormir, em 2017 você lançou o seu primeiro EP autoral. Para quem não sabe o que é um EP, é um Extended Play, que é uma gravação em disco que pode ser em vinil, formato digital ou CD, que é longa demais para ser considerado um single e muito curta para ser considerado um álbum musical. Seria algo entre um meio termo com cerca de quatro ou cinco músicas. Então conte-nos um pouco sobre a criação desse EP e onde que essa galera pode estar encontrando para ouvi-lo.
Vivi Seixas: A história desse EP foi bem bacana porque… (pausa). Antes, o lançamento do EP foi em 2017, como você disse… meu HD está meio cheio, minha memória não é muito boa pra data… Antes disso eu já tinha conseguido com as gravadoras os canais de alguns discos do meu pai, separados, os instrumentos, a voz, a guitarra, a bateria. Eu tinha conseguido uns CDs, com essas gravadoras, com esse material… nem pensava em ser DJ ou produtora ainda. Guardei aquilo ali. Pensei: algum dia eu vou fazer alguma coisa com isso. E aí comecei a tocar e tal, e a gravadora Warner me chamou para fazer, para eu gravar esse EP. E nessa época, eu tocando música eletrônica… já tinha essa, lógico… eu falei “Meu Deus do céu, que responsabilidade”! Primeiro né? Fazer qualquer trabalho em cima da obra do Raul Seixas, na obra do meu pai. Ao mesmo tempo, eu como filha, como fã que sou – porque eu sou muito fã dele, e além de filha coruja -, também gostaria de fazer a minha homenagem ao meu pai! O Brasil inteiro homenageia Raul, do rap ao sertanejo, o Brasil homenageia Raul. Eu falei: eu também quero fazer uma homenagem. Então eu me preocupei em fazer um EP que tivesse a minha identidade do eletrônico, que não perdesse também a identidade das letras do meu pai, que são tão importantes e são tão profundas, e fazem a gente pensar tanto, né? Queria manter essa identidade também e chamei alguns músicos para dar um “que” um pouco mais orgânico, ficar um trabalho que todo mundo curtisse, o pessoal que gostasse de eletrônico e o pessoal que não curtisse eletrônico… ficar uma coisa assim, bem mais acessível. Então eu chamei o Arnaldo Brandão, que é o meu padrasto, que é vocalista do Ramayana, que foi uma banda que fez muito sucesso nos anos oitenta. “Totalmente demais…”.1 Ele é um grande baixista, o Arnaldo Brandão. Ele botou uns baixos em algumas faixas. O Donatinho, que é filho do João Donato, que é um grande amigo meu, excelente tecladista, também gravou uma faixa, A Geração da Luz. Eu fiz uma versão do Rock das Aranhas, que é uma versão… É uma música bem acelerada. Transformei num Drum and Base, que é um estilo também de música eletrônica, mas ele é bem acelerado, bem quebrado. Então eu fiquei muito orgulhosa com o resultado desse CD… me deu um baita frio na barriga, mas fiquei muito orgulhosa pelos feedbacks que eu tive.
E outra coisa que eu tinha em mente também era deixar para nova geração, um pouco de Raul, né? Isso foi legal que muita garotada que não conhecia Raul Seixas conheceu através desse meu CD, desse meu EP. Então foi bem bacana. O meu pai tinha uma ligação… ele tinha uma preocupação muito forte, tanto que ele fez A Geração da Luz, em deixar uma mensagem também para a geração da luz. Vão ser donos disso tudo no futuro, né? Ele tinha essa preocupação, então eu achei bem legal poder tocar o coraçãozinho da geração da luz.
Ricardo Lacava: Vivi, em 2004, você tocou pra um público de mais de cinco mil pessoas no evento “O Baú do Raul”, que foi uma homenagem ao seu pai na Fundição Progresso, no Rio de Janeiro. Você também já chegou a remixar algumas músicas de Raulzito. Bom, quando Raul Seixas veio a falecer, em 1989, esse gênero de música eletrônica ainda praticamente no Brasil não existia, né? Veio chegar alguns anos depois. Ele que misturou baião com rock, com bolero, samba, blues, country, rap, mais de trinta ritmos musicais, eu queria saber se ele tivesse vivo, se você acha que sairia daí uma parceria, um bem bolado… Daria pra misturar todos esses ritmos e juntá-los, e quem sabe, fazer essa união entre pai e filha?
Vivi Seixas: Eu não tenho dúvidas! Eu não tenho dúvidas. Que o meu pai… chamam ele do Rei do Rock, mas como você falou, inclusive tem isso escrito, listado no livro, na biografia da minha mãe “Coisas do Coração” são mais de tantos estilos que você acha nas músicas do meu pai, rock, baião, samba, rock, rap, forró, enfim, uma infinidade. Eu tenho certeza absoluta que se ele estivesse vivo, ele ia me dar a maior força. Ele ia botar um beat, mas não diria que seria uma música pra fazer, tocar numa balada.. mas falasse “aí, pai, bota um vocal aqui, escreve aqui um negócio pra mim que eu quero fazer um som”. Com certeza ele ia topar… e ele ia botar, ele ia dar uma modernizada sim, usar uns aparelhos mais modernos, uns sintetizadores da nossa época. Com certeza eu não tenho sombras de dúvida. Ele era uma pessoa muito curiosa, né? Meu pai gostava de tudo quanto era estilo, tenho certeza. Ia ser a maior curtição, ia ser a maior curtição. Eu penso muito isso, se ele estivesse vivo, como é que seria, quantos os papos a gente ia bater, quantas ideias a gente já trocar… Porque eu era muito pequenininha, né? Quando meu pai e minha mãe se separaram, eu tinha quatro anos de idade, e eu vim morar no Rio com ela, meu pai ficou em São Paulo e quando ele veio a falecer, eu estava com oito. Então a gente teve convivência, assim, né? Eu lembro, tenho muita lembrança, de criança, né? Mas, adulta, poder sentar e trocar uma ideia com ele ia ser muito especial.
Ricardo Lacava: É, com certeza ia ser muito bom se Raulzito ainda estivesse vivo, podendo explorar toda essa criatividade e grandeza compartilhada com toda essa sua vontade e genialidade. Vivi, como você descreveria a personalidade e a filosofia de seu pai?
Vivi Seixas: Olha, a personalidade… choque vocês ou não, o meu pai era um cara muito humilde, assim, de uma humildade e uma generosidade gigantesca. Assim, capaz, se você falasse “Raulzito, eu gostei. Porra, maneiro os teus óculos, man!” Ele falava “Gostou dos meus óculos? Toma aqui para você!” Ele não tinha apego nenhum, sabe? Com coisas materiais. Tanto que tem uma história que ele passou, acho que foi em Nova York, que ele viu um cara passando fome. Ele foi lá e deu o casaco dele para o cara. Ele era uma pessoa muito generosa, uma pessoa muito humilde. Tratava todo mundo de igual pra igual. Não importa se você era rico, se você era pobre.
Era uma pessoa muito tímida… muito tímida, muito na dele. Falava baixinho, não gostava de escândalo, não gostava de confusão. Era uma pessoa muito amorosa. E é engraçado que a gente vê esse Raul doidão, maluco beleza no palco, mas ele era bem o oposto. E um excelente ator, né? Ele dizia que era tão bom, tão bom ator, que se passava como cantor e todo mundo acreditava. Isso é maravilhoso! E a filosofia… a filosofia de você ser feliz de verdade, respeitar o próximo, acreditar no que você quer, nos seus sonhos, nas suas verdades, no respeito pelo outro. Acho que essa era a filosofia dele, sempre pregando o amor. Não é mole não! Tá pra nascer um sujeito igual a ele. Muito orgulho, muito. Quando me perguntam como é que é ser filha do Raul Seixas… eu recebo muito essas perguntas, sabe… essa pergunta. Muito orgulho e muita honra! É o que eu costumo responder!
Ricardo Lacava: Agora, falando um pouco sobre a família de Raul Seixas, que quando veio a falecer você tinha apenas oito anos… era uma criança. Eu queria saber sobre o seu contato com o avô, o seu avô paterno, Raul Seixas Varela, que veio a falecer dois anos depois da morte de Raul, em 1991… inclusive chegou, quando você nasceu em 1981, a escrever uma música pra você, Acalanto, para minha neta Vivian… e contatos também com a sua avó paterna, Maria Eugênia dos Santos, que veio a falecer em 2002, ou seja, você já era uma mulher de vinte e um anos, e assim como o seu tio Plínio dos Santos Seixas, irmão de Raulzito, o irmão mais novo e único irmão dele. Como era esse contato com a família de Raul, essa contradição cultural, visto que a família de sua mãe, Kika Seixas, era carioca e a de Raulzito era baiana. Ou seja, era muita tapioca misturada com feijoada carioca? Conta pra gente!
Vivi Seixas: Contato com a minha família Seixas… (pausa). Meu avô Raul Varela Seixas, eu tenho poucas memórias porque eu era bem novinha. Quando ele faleceu, meu pai faleceu, eu tinha oito, então quando meu avô faleceu, dois anos depois, eu estava com dez. Então eu tive pouco contato. Lembro pouco do meu avô.
Da minha avó Maria Eugênia, lembro mais. Minha mãe e ela eram muito, muito amigas. Sempre mantinham contato, sempre escreviam cartinhas e sempre se ligavam. Eu ia a Salvador visitá-la… ia visitar minha avó. Ela era doida por mim, minha avó Maria Eugênia. Eu, doida por ela… Ia visitar meu tio. Então, eu tenho mais lembranças da minha vó e tive mais contato com ela.
O meu tio Plínio, a gente se fala até hoje, volta e meia a gente se encontra. Ele é assim, a pessoa mais próxima, que quando eu estou por perto, eu fico olhando pra ele… fico assim, babando. E o sotaque… o sotaque baiano que é uma delícia… ele me chama de Vivinha, “Oh Vivinha”, é bom demais. Eu me emociono toda vez que estou perto do meu tio. Ele é uma figura. Ele é muito engraçado. Você sabe que ele tem dois filhos, o Ivan e o Fabinho, que são meus primos… e eu contando para os meus primos que o meu pai tinha um personagem que ele inventava, que se chamava Capitão Garfo, que muita gente conhece essa história de capitão Garfo, né? Capitão Garfo era primo do Capitão Gancho e roubava minhas bonecas pra botar no congelador.
E aí eu contando essa história… Conto muito essa história porque perguntam muito a mim das lembranças que eu tive do meu pai… Capitão Garfo… Aí um dia, eu tomando uma com meus primos lá na Bahia, meu primo falou, o Ivan, falou “Vivi, vem cá, lembra aquela história”, contou todo emocionado, me contando isso, “Lembra aquela história do Capitão Garfo que seu pai fazia com você? O meu pai fazia igualzinho com a gente. Só que ele contava a história do camarão que usava óculos escuros no fundo do mar”. Então é uma coisa de família mesmo, né? Eles eram… eles se amavam muito. Meu tio Plínio, meu pai. Eles eram melhores amigos. Meu tio Plínio sofreu muito, muito com a perda do irmão. Muito mesmo… Então é uma pessoa que eu tenho muito contato até hoje.
E que mais? É, em fevereiro, eu passei vinte dias em Salvador pela primeira vez na minha vida. Fui passar uma temporada grande em Salvador, revendo os lugares que meu pai passou… eu fui no Cine Roma… Fui visitar o Cine Roma, que virou uma igreja… mas fui lá visitar e fui em alguns lugares, né? Foi onde meu pai percorreu, e você não vai acreditar… Coincidências, e eu digo assim entre aspas, porque coincidências não existem para mim, e fui… eu fiquei hospedada no mesmo prédio que o meu pai morou, na Rua Euclides da Cunha, no bairro da Graça. Olha que loucura! Eu fiquei hospedada no sétimo andar e o meu pai morou com toda a família no quinto andar. E foi assim, muito… Você chega no prédio, já tem uma placa escrita “Aqui, morou o Raul Seixas do ano tal ano ao ano tal”. E então, já começou assim a minha viagem para Salvador… foi… foi realmente assim. Foi uma viagem, um resgate da minha ancestralidade, porque já chegou assim. Eu entrei no primeiro Uber que eu peguei e estava tocando Raul, e uau! Coincidência, né? Tá. Aí, de repente, eu descobri dois primos meus por parte da família Seixas… um deles é o proprietário desse apartamento que eu fiquei hospedada. Eu descobri recentemente esse meu primo que coincidentemente comprou o apartamento que era da minha família Seixas. Olha que loucura! E aí eu fui visitar esse apartamento que minha família morou. Quem está lá agora é o síndico do prédio. Quando eu entro no apartamento, eu me acabei de chorar. Foi muito emocionante, porque o meu tio Plínio… Falei, “tio, eu vou no apartamento”, ele falou, “Ah, eu lembro do piso, era uma sala grande. A primeira sala era o escritório do seu avô, onde ele corrigia as provas, o outro era nosso quarto, à direita”, e eu fui entrando, entrando naquele apartamento e sentindo tanto a minha vó, o meu vô, o meu pai. Foi muito emocionante. O síndico, o dono do apartamento, tem todas as escrituras até hoje assinadas com a letrinha do meu avô. Então essas coisas começaram a acontecer muito fortes em Salvador, sabe? De eu estar passeando assim, e de repente passa um barco assim escrito “Água Viva”, vários toques assim. Eu entrei no ônibus para ir para uma outra cidadezinha e quando eu entrei, qual era o nome do motorista? Elvis! Sabe, umas coisas que eu dava risada sozinha. Assim, era ele, era o meu vô, era minha avó, era todo mundo ali mesmo, superfeliz que eu estava conhecendo e resgatando mesmo as minhas origens. E aí quando eu fui para essa outra cidade, que era em Barra Grande, eu conheci a família da minha vó Maria Eugênia, que são de Cantuá. Olha que loucura! O outro lado da família que eu não conhecia, muito bacana, são pessoas muito especiais. Tem um hotel boutique maravilhoso lá em Jorge Leite, chamado Vila Kandui.
Ricardo Lacava: Vivi, outro dia fuçando ali na internet, eu me deparei com uma frase sua em uma entrevista dizendo, abre aspas: “Raul era um cara careta”, fecha aspas. Conte melhor essa história para a gente.
Vivi Seixas: Eu acho que eu me equivoquei na palavra “careta”. A palavra certa seria conservador. Como meu pai veio de uma família tradicional baiana, ele gostava dessa coisa ser o provedor da família. Ele gostava da ideia de casamento e de educação para as filhas. Eu acho que eu me expressei mal, quando eu falei a palavra “careta”… seria conservador. E é engraçado que, mais uma vez, é como se fosse duas personalidades no palco, aquele cara revolucionário, e em casa ele gostava dessa onda de ser pai, de ser marido, que vinha aí bem mesmo dessa família tradicional baiana.
Ricardo Lacava: E quais são as suas músicas favoritas de Raul Seixas e por que, assim como o seu álbum preferido, também.
Vivi Seixas: Ah, essa é difícil… perguntar as minhas músicas preferidas de Raul… Mas eu posso te falar que algumas eu amo… Por Quem os Sinos Dobram foi uma música que eu escutei muito, uma fase da minha vida… Aquela fase que eu tinha decidido seguir a carreira DJ na música eletrônica. Eu fui para um caminho oposto do que os fãs do meu pai esperavam e gostariam que eu fosse. Eu acredito que eu tive que ter muita coragem para seguir o meu caminho. Então essa música realmente foi muito especial para mim, me deu muita força. Outra também, nessa época que me marcou bastante, foi No fundo de quintal da escola. Mas eu amo Água-viva. Eu amo o Carpinteiro do universo, Medo da chuva, O segredo da luz, Coração noturno… ah meu Deus do céu, é difícil… E álbuns preferidos são, coincidência ou não, eu gosto dos álbuns da época da minha mãe, da Kika, Metrô Linha 743 e Raul Seixas, um da capa azul da Eldorado, e Abre te Sésamo, que são os meus preferidos.
Entrevista realizada em março de 2023
Ricardo Lacava – Escritor (ricardolacava@yahoo.com.br)
(PARTE I)
4 Comentários
Maravilhosa essa entrevista… tive a oportunidade de assistir o Ricardo, como radialista, ao vivo, entrevistando a Vivi…
Vivi: “Porque todos somos um produto, né?”
Essa frase da Vivi me pegou aqui… então??? Somos produto do meio, ou o meio do produto em evidência? Recentemente escrevi isso… a questão que a Vivi levantou me lembrou isso…
Parabêns pela conexão de vocês partilhada aqui conosco…