Entrevista Vivi Seixas – A filha caçula de Raul Seixas (Parte II)

Ricardo Lacava: Agradeço novamente a presença aqui com a gente, Vivi. E iniciando a primeira pergunta, eu queria saber se você escuta muito “Toca Raul” em seus shows e como que você lida com isso.

Vivi Seixas: Ahh, eu escuto muito “Toca Raul” nos meus shows… eu dou risada. Eu acho engraçado quando eu tenho uma oportunidade, eu toco, claro! Porque as pessoas esperam que eu toque. Então, como minha pegada é mais na música eletrônica, eu toco, um remix ou alguma coisa assim nessa pegada. Mas é curioso porque mais do que “Toca Raul”, sabe o que eu escuto? “Vivi, o seu pai mudou a minha vida. Eu sou quem eu sou hoje, graças ao seu pai”. Isso é muito bacana. Isso é muito bacana de escutar, mais do que o “Toca Raul”.

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Ricardo Lacava: E continuando nossas perguntas, eu queria que você dissesse se existe algum mito em relação a Raul Seixas que você gostaria de esclarecer ou desmistificar. Conta pra gente um.

Vivi Seixas: Algum mito em torno do meu pai… Tem tantos mitos, tem tantas historinhas aí, algumas bem engraçadas. Tem gente que diz de todas as formas que ele nasceu em Quenguenhem e não em Salvador… que ele gostava de futebol, que era flamenguista… tem tanta história, mas nenhuma em especial…

Raul Seixas e Vivian Seixas. Foto : Redes Sociais

Ricardo Lacava: Vivi, pode-se dizer que o último parceiro de seu pai foi o Marcelo Nova, do qual essa união surgiu o álbum Panela do Diabo, em 1989. Marcelo Nova e sua esposa Inês Nova, são amigos da família até hoje. Inclusive você já fez diversos shows com ele ao redor do Brasil. Eu queria saber dessa relação e se, além dele, quais outras grandes personalidades, amigos de seu pai que te marcaram a vida?

Vivi Seixas: Eu amo Marcelo Nova! Eu amo a Inês! Eu tenho, assim, muito carinho pelos dois. E o Marcelo, ele deu um suporte num momento da vida do meu pai, que meu pai estava muito esquecido, meu pai estava deprimido, meu pai estava muito debilitado e eu posso dizer que meu pai morreu feliz, morreu no palco, morreu fazendo o que ele gostava. Graças a força que o Marcelo Nova deu pro meu pai… outra pessoa também… meu pai era uma pessoa de poucos amigos. Eu sempre falo isso. Uau, um trovão aqui! – (na hora da gravação estava chovendo e ressoou um trovão). E outro, um grande, grande amigo do meu pai que se foi recentemente, que eu sofri muito com a perda dele, que foi o Cláudio Roberto. Aquele ali… realmente os dois eram loucos um pelo outro, tinham uma parceria e uma amizade muito linda. E eu posso dizer que eu acho que eu nunca sofri tanto na minha vida com a perda de alguém como eu sofri com a perda do Cláudio Roberto. É como se eu tivesse perdido meu pai de novo, porque quando eu perdi meu pai, eu tinha oito anos de idade. Eu era uma criança muito novinha, então meio que foi um sentimento realmente, como se eu tivesse perdido um pai. E eu fico até muito emocionada toda vez que eu falo no Cláudio. Eles eram doidos um pelo outro. Eu acho que ele foi um dos maiores parceiros do meu pai, sem dúvidas.

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Ricardo Lacava: Nossa, é muito massa! É legal saber que mesmo depois da morte do seu pai, essas pessoas continuaram presentes em sua vida, né? Um grande salve ao Cláudio Roberto, que uma hora dessa deve estar lá em cima, lá na beira da piscina, tocando e compondo músicas inéditas com Raul Seixas… e um grande salve ao Marcelo Nova, o Marselhesa, que esperamos contar com a presença dele aqui no nosso programa Plunct, Plact, Zum.

Vivi, sobre o livro Coisas do Coração, de Kika Seixas, publicado em 2020 – leitura que indico para todos os fãs de Raul Seixas -, separei algumas histórias engraçadas aqui de quando você ainda era bem pequena. Eram brincadeiras que seu pai costumava fazer com você. Uma das suas prediletas era esconder as bonecas dentro da geladeira e no dia seguinte ele contava uma história onde existia um personagem chamado Maluquinho, que teria escondido as bonecas de Vivi em algum lugar. E aí vocês saíam procurando pela casa, atrás do sofá de baixo dos móveis, até chegar na geladeira e descobrir que elas estavam lá. E aí você ficava aos gritos de alegria, né?

Vocês também costumavam entrar no estúdio de Raul com tudo escuro e uma lanterna, e saíam procurando formigas pelas frestas das paredes. Mas tem uma aqui que me chamou a atenção, de quando você estava na creche, todas as crianças acabaram ganhando um peixinho de estimação, e aí ele virou o mascote da casa… e você chegou toda feliz… Raul e Kika já arrumaram um lugar para pôr o peixinho, que vocês batizaram com o nome de Felipe… só que houve uma pequena tragédia, né? O peixinho foi colocado dentro de um de um aquário com água tirada da torneira, e essa água normalmente tem cloro, e o peixe não resiste ao cloro… No dia seguinte, quando seu pai e sua mãe acordaram, viram que o peixinho Felipe estava morto, e aí o sepultaram dentro da privada, onde após várias descargas, sem ele sumir – ficou em movimento ali e não descia de jeito nenhum -, finalmente desapareceu no turbilhão da descarga. E aí veio a pergunta: O que vamos falar para a Vivi? E aí, Raul teve uma ideia genial. Quando você acordou e perguntou onde estava o peixinho, ele respondeu: “Vivi, sabe o que aconteceu? A mamãe do Filipe ficou com muita saudade dele e veio buscá-lo de volta. Ela não estava aguentando ficar sem ele”. E aí, com essa história, eles convenceram você, que respondeu: “Claro, né, papai. Ela tem que ficar com o filhinho dela. Mas eu tinha gostado tanto dele…”.

Então, são histórias aí que a gente vê no livro Coisas do Coração, e eu queria fazer uma pergunta para você. Você tem alguma história ou lembrança especial para compartilhar sobre o seu pai, que talvez o público geral ainda não saiba?

Vivi Seixas: Bom, essa história do peixinho Filipe ninguém sabia, é maravilhosa. Realmente os fãs conhecem muito sobre o Capitão Garfo, né? Que o Maluquinho também era um personagem… Meu pai adorava. Ele e o irmão dele, o Plínio. Meu tio Plínio tinha essa mania de criar personagens quando eles eram meninos e meu pai gostava muito de criar esses personagens para mim… Então o Capitão Garfo um destes… Ele era o primo do Capitão Gancho, que escondia um garfo na manga e roubava minhas bonecas. Essa daí todo mundo tá cansado de saber… A história da formiguinha no escuro é meio que inédita também, e já esta do peixinho Filipe, ninguém sabia dessa história… super inédita… e minha mãe usou essa história da família dele estar com saudades…  

Meus bichos… Eu sempre tive bicho, mas só que sempre acontecia uma tragédia… ou a gata ia parir… aí o gatinho, em vez de sair com a cabeça, saía com a perna primeiro… aí a gata morreu… o outro gato ficou preso no estúdio… a empregada fechou a porta do estúdio, trancou o gato lá dentro, o gato ficou sem oxigênio… tem a tragédia do peixinho Felipe… tem o meu hamster que quase cozinhou de tanto calor…

Enfim, minha mãe sempre usava essa história… aí tá com saudades, veio buscar… E meu pai, era um pai… Eu lembro muito dessas (histórias)… porque como eu tinha oito anos, as lembranças que ficaram foram essas de brincadeiras assim divertidas e personagens que ele criava para mim.

Capa do Livro “Coisas do Coração”, de Kika Seixas e Toninho Buda. Foto: Internet

Ricardo Lacava: Outra parte do livro que separei, do livro Coisas do Coração é uma carta escrita por seu pai em 1984, onde ele estava internado no hospital e diz assim, abre aspas, “minha filha Vivi, que bom, já fiquei bom, bom, estou fazendo muta e tudo. Hospital é chato, não tem ninguém. E muito obrigado pela sua reza para papai ficar bom. Foi você quem fez papai ficar bom. Não fiquei muito sozinho, pois o Capitão Garfo vinha me ver toda hora e como não tinha boneca por perto, ele ficava meu amigo. O bonzinho e o maluquinho, sempre fazendo tudo errado. No hospital deitado, e ele pensou que ele é que era o doente e deitou em cima de mim. Já pensou? Esse maluco faz cada coisa engraçada. Estou morrendo de saudades de você, minha filhinha. Daqui a pouco eu estou aí para te ver, é que agora papai vai ter que fazer uma porção de shows para ganhar um bocadão de dinheiro para comprar coisas, surpresas e presentes para você. Eu amo você e sua mãe. Fiquem direitinhas, tá?  Com todo carinho, papai Raul. PS: Nunca mais papai vai ficar doente. Eu tô comendo o prato todinho. Adorei seus desenhos, são lindos todos os quatros, o da gravata do papai, as duas menininhas, os pedacinhos de papéis coloridos, o dos traços riscados que você inventou. Esse é para você. Lembra dele?”, (e aí mostra um desenho). Bom, isso foi em 1984. Cinco anos depois ele viria a falecer. Nesse dia do falecimento, você foi com sua mãe de avião até Salvador, mas pediu para não ver o pai morto, ficando com os primos, filhos de Plínio Seixas, irmão do Raul, na casa dele. Eu queria saber, nessa época, com apenas oito anos, você já tinha ideia da grandeza e da influência que seu pai representava para toda aquela geração?

Vivi Seixas: Ah… essa cartinha… não tem uma vez que eu não leia essa cartinha que eu não me emocione, que eu não choro. Realmente ele era muito carinhoso, um paizão muito, muito querido.

Ai, quando eu era criança eu tinha noção que ele era um cantor, mas eu não tinha… eu ainda não entendia a fundo as letras, né? Eu ouvia uns Pluct, Plact, Zum, ouvia o Peixuxa, mas eu não tinha, não tinha noção não… Eu vim ter essa noção quando eu comecei a ficar maiorzinha e comecei também a conviver mais com os fãs, a responder. Então, quando as pessoas vinham, me falavam “Olha, o seu pai mudou a minha vida. Eu sou quem eu sou por causa do seu pai”. Eu escuto mais isso do que o próprio “Toca Raul”, que me gritam muito por eu ser DJ, né?

Ricardo Lacava: É isso aí, com certeza. Muitos de nós fomos criados e educados pela discografia de Raul Seixas. Vivi, eu sei que você tem um canal no YouTube chamado Viviajando? Conte para os nossos ouvintes que querem dar uma viviajada com você nesse canal sobre o que rola nele.

Vivi Seixas: É, eu me arrisquei em fazer um programa de viagens… bem na guerrilha… bem sem pretensão nenhuma, onde eu fui pra Minas Gerais… Na verdade, era pra ser um piloto, um teste… um piloto, pra ver se dava certo, se eu levava jeito como apresentadora… E tem alguns episódios que você pode encontrar no meu canal do YouTube, Vivi Seixas, já tem uns dois anos.

Foi antes da pandemia que esse programa foi ao ar e foi tudo na guerrilha… Eu nunca apresentei programa. O Rafa Zaia, que está nesse programa comigo, Viviajando, nunca fez imagens, então a gente aprendeu pra caramba a editar, a filmar…

Então, se passa em Minas Gerais, né? E eu tenho vontade de fazer outros. Viviajando 2, por outras cidades do Brasil. Fomos a São Tomé das Letras, também, que é uma cidade que respira Raul Seixas. Quem puder e quiser, confira… Tá bem amador, galera, mas foi feito com muito carinho.

Capa do EP de Vivi Seixas, com vocais inéditos de seu pai. Foto: Internet

Ricardo Lacava: E quais são seus projetos artísticos para os próximos anos e como fazer para contactá-la para shows? E aqui eu deixo a dica pra rapaziada da UFSCar para o próximo Tusca, que é o maior e o mais tradicional evento universitário que acontece no Brasil, onde ocorre competições esportivas durante o dia, e à noite, as baladas. Conte um pouco pra gente então desses seus planos.

Vivi Seixas: Sim, eu tô animada. Tenho duas faixas que eu vou lançar… A primeira faixa vai ser lançada agora no dia nove de abril e é uma faixa original que eu fiz com um produtor de Techno. Pra quem não sabe, Techno é um estilo de música eletrônica que é um pouquinho mais industrial, um pouquinho mais pesado do que o House que eu toco. Então eu fiz uma faixa com esse amigo meu que é produtor de Techno da nova geração, um menino muito fera, e a gente se juntou para fazer uma faixa. Um Techno House, que se chama Mad Cat e vai ser lançada agora no dia nove de abril.

E a outra novidade é que eu estou trabalhando num remix, quase finalizando… é um remix Sociedade Alternativa, com um casal carioca aqui do Rio de Janeiro, de produtores. E essa faixa tá muito, muito, muito especial. Tá muito dançante, tá muito bacana. Eu usei todos os canais da Sociedade Alternativa… então, a bateria, a guitarra, os teclados é tudo original. E tá muito legal. Tô muito orgulhosa desse trabalho, muito animada pra lançar. Mas o lançamento vai ficar para o dia vinte e oito de junho, que quem é raulseixista sabe que data é essa… Aniversário de vida do papai.

 Ah, e tem Raul na web e o Raul Seixas na web, que é esse canal oficial do Raul Seixas que eu administro, que tem no Facebook, no YouTube e no Instagram.

Ricardo Lacava: Valeu Vivi! Então fiquem ligados aí dia vinte e oito de junho, lançamento e um grande presente de aniversário para o Raulzito. O tempo é curto, mas dá para fazer mais uma pergunta para nossa convidada especial Vivi Seixas. Agradeço mais uma vez a sua presença aqui em nosso programa. Na verdade, o que eu vou fazer não é uma pergunta, mas eu queria que você deixasse aqui uma mensagem para todos os velhos malucos beleza, assim como para essa nova geração que veio após 1989, A Geração da Luz. Vai lá, Vivi!

Vivi Seixas: Ah, para os fãs antigos, eu só tenho a agradecer. É lógico que eu sei da grandiosidade e da genialidade, de toda a diferença que o meu pai fez para a música brasileira, e que ele fez nesse planeta com as letras dele. Mas eu tenho a agradecer muito aos fãs, porque é por causa deles também que meu pai está se mantendo tão vivo até hoje, tão querido, tão lembrado, tão homenageado, com tantos tributos. Então eu só tenho a agradecer aos fãs antigos.

E aos novos fãs, assim, eu fico muito surpresa com a Geração da Luz, com as crianças novinhas curtindo Raul, e os adolescentes, as crianças, pessoas que não estavam nem vivas quando meu pai estava aí. Então me dá muita esperança de um futuro melhor para o nosso país, saber que essas crianças, esses adolescentes, esses jovens da nova geração estão escutando Raul.

Autor

  • Ricardo Lacava

    Veterinário graduado pela UNESP, mestrado pela UFSC e Doutorado pela UNESP/Harper Adams University (Sanduíche/Reino Unido). Graduação em letras pela UFSCAR em andamento. Servidor público federal do Ministério da Agricultura desde 2008. Menção honrosa no Prêmio Literário Cidade de Manaus 2024. Autor do romance “Infecundo Solo”, segundo lugar no Prêmio José de Alencar, Concurso Internacional de Literatura União Brasileira de Escritores do Rio de Janeiro, 2017. Vencedor do Prêmio Literário Uirapuru 2019 com o livro “Astúncio, o estúpido esclarecido” e do XIV Prêmio Literário Livraria Asabeça 2015 com a obra “O Canto do Urutau”.

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