Qual é o tipo de herança para está construindo?

Essa semana minhas reflexões sobre a vida deram lugar às reflexões sobre a morte e o que acontece depois da chegada dela. Mas, antes que você pense que eu vou falar sobre as elucubrações que giram em torno do momento final, ou do último dia de alguém, eu já te adianto que o papo é de gente bem viva. Talvez meio mortas por dentro, mas com seu coraçãozinho batendo direitinho e todo o seu sanguinho correndo pelas veias.

O papo real é sobre a herança. Comecei pensando em como ficam as coisas de quem vai dessa para uma melhor, como dizem os populares; pensei nos lugares que ficam vazios daquela presença, também nos bens amealhados com tanta devoção. No processo da morte, aquilo que era importante para o morto, mas claro que era importante para o, então, vivo, deixa de ser importante. Os lugares vazios logo são preenchidos, cada coisa encontra um novo lugar, e vida que segue.

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Mas, aqui os meus pensamentos ficam em torno da herança de pessoas vivas, bem vivas, tão vivas que têm a força de deixar um legado nas mentes de seus herdeiros que finca pior que estacada, marca mais forte que tatuagem barata. E é tão difícil de negar essa herança meio macabra, porque ela é enfiada nas mentes inocentes desde a infância, sem que haja resistência.

Você deve estar achando que eu estou muito maluca hoje… Mas não estou não, calma que você vai entender tudo.

Às vésperas de eu completar 51 anos, o que vai acontecer exatamente daqui dois dias, você pode pensar que estou no meu inferno astral, que estou meio deprê com a idade que vem chegando lentamente, e que todas as marcas desse tempo começam a ficar mais evidentes no rosto, no corpo, em tudo, mas não é isso não.

Eu te diria que são minhas observações sobre o tempo, a perspicácia que somente a idade e a maturidade nos trazem. Eu diria que é difícil demais abrir mão do próprio ego, muitas vezes ferido, para manter e preservar a mente dos herdeiros saudáveis.

Agora é a hora que você deve estar se perguntando que confusão é essa entre morte, herança, idade, legado etc. e tal, e eu te digo que é justa a sua indagação e te chamo a refletir o nosso papel como aqueles que deixarão uma herança.

Só de ouvir a palavra HERANÇA, como eu disse lá trás, imaginamos alguém que morreu e deixou bens para serem divididos entre os herdeiros. Mas a verdadeira herança, começa no dia em que o bebê nasce. Desde a escolha da roupinha até o que esse bebê come é uma decisão tomada por alguém, desde a mãe até a tia da escolinha, e ok, porque um bebê não tem poder de decisão, não sobreviveria sem esses cuidados.

Porém, o tempo vai passando, o bebê vai crescendo, as pessoas continuam tomando decisões por essa pessoinha, que deixou de ser bebê há tempo, sem perceberem que já passou da hora de pararem. Passou da hora de deixar que aquela jovem pessoa tome as suas próprias decisões. Acertar ou errar agora passa a ser o trabalho do indivíduo que cresce, ainda na infância, quando decide se gosta ou não de alguma coisa.

Você pode ponderar que crianças não podem tomar decisões sozinhas, e eu concordo, mas em partes. Crianças têm que ir recebendo o direito de opinar, assim fortalecem a confiança individual, podem escolher pequenas coisas por si só, mesmo que isso acabe em uma combinação esquisita de uma camiseta listrada com uma bermuda florida. Mas, as pessoas adultas, e com destaque para as mães, não conseguem deixar a criança decidir.

Essas pequenas atitudes das crianças vão fortalecendo a base que segurará o adulto de amanhã, mas insistimos em não deixar… O mais importante parece ser o trabalho de enfiar o que importa para o adulto na cabeça da criança, uma herança de pessoa viva, com se o medo de deixar de existir fosse mais importante do que o direito de quem ainda tem uma vida inteira para existir por si só.

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Ainda pior do que podar a escolha dos filhos, é aquela herança involuntária, meio macabra, como eu disse, de querer que esse novo ser humano herde aquilo que é importante para você. Se você é uma pessoa voluntariosa, será que sua cria tem obrigação de herdar isso de você? E assim, os seus gostos musicais, suas comidas, a forma que escolheu viver, o jeito que cuida de tudo e de todos. Será que seu herdeiro ou herdeira quer ser como você? Quer herdar o que somente para você é importante?

Não estou discutindo valores, ética, responsabilidade social, estou falando de quando a gente pode tentar impor o que é nosso para o outro, mesmo que esse outro seja seu filho ou filha, então, CUIDADO… Esse novo ser vai conquistar o direito de tomar suas decisões, fazer suas escolhas e você é responsável somente por orienta-lo ou orienta-la, porque, no final das contas, cada um é responsável por si.

É fácil? Óbvio que não! Mas nossos papeis, de mãe, pai ou responsável, é conduzir para a vida e não para a morte, onde chega a conta da herança ruim, sombria e cheia de carrapichos. Deixe o seu legado todos os dias, não somente depois que os seus espaços estiverem vazios, deixe um legado de construção, coragem e fé, jamais um de dor, atropelo e tristeza.

Pesou o clima, né? E a vida é assim, antes de construir, tem que limpar o terreno, e sem isso, não há construção boa, não.

Em tudo, lembre-se que FELICIDADE é uma construção e precisa de um tijolinho todos os dias.

Beijo da Linda para você, até a próxima.

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