Uma pesquisa realizada pela consultoria UTA IQ — braço de dados da agência United Talent Agency — em parceria com a Screendollars e o analista Stephen Follows, revelou que 55% dos executivos que trabalham com exibição de filmes em Hollywood acreditam que os cinemas como conhecemos deixarão de existir em menos de 20 anos. O levantamento ouviu 246 profissionais da indústria cinematográfica, incluindo distribuidores, exibidores e executivos de estúdios, e foi divulgado originalmente pela revista Variety.
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O cenário mais alarmante vem justamente de quem administra as salas de exibição: 55% desses executivos acreditam que o modelo atual de cinema não resistirá até 2045 — e parte deles prevê esse colapso em 10 anos ou menos. Já entre os executivos de vendas e distribuição, o número é ainda mais significativo: 62% concordam que a exibição tradicional está com os dias contados.
Outro dado importante é que apenas 8% dos entrevistados afirmaram que as receitas dos cinemas voltaram aos níveis pré-pandemia. A grande maioria — mais de 90% — acredita que os lucros seguem abaixo do que era registrado antes de 2020. Cerca de 77% dos entrevistados também apontaram o lançamento simultâneo em streaming como um fator prejudicial ao desempenho nas bilheterias.
Como resposta, 81% dos profissionais defendem a manutenção de uma janela exclusiva de pelo menos seis semanas para as salas de cinema antes que os filmes sejam liberados nas plataformas digitais, como forma de preservar a relevância do formato e estimular o público a retornar às salas.
Os principais fatores que impulsionam essa percepção:
- Mudança nos hábitos de consumo, com o crescimento do streaming e da cultura on-demand.
- Efeitos persistentes da pandemia, que aceleraram a migração do público para o ambiente digital.
- Aumento dos custos para os consumidores, o que tornou a experiência de ir ao cinema menos atraente.
- Concorrência com experiências domésticas cada vez mais imersivas, como TVs de alta definição, som surround e lançamentos simultâneos em plataformas como Netflix, Max e Disney+.
- Desinteresse de públicos mais jovens, especialmente da Geração Z, por formatos tradicionais e horários fixos de sessão.
E no Brasil?
De acordo com o último relatório da Agência Nacional do Cinema (Ancine), em 2023, os cinemas brasileiros receberam 114,6 milhões de espectadores, número que representa uma recuperação parcial após o impacto da Covid-19. Em 2019, esse número era de mais de 175 milhões, o que mostra que o público ainda não retornou em peso às salas.
Além disso, as produções nacionais vêm perdendo espaço. Segundo o Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual, os filmes brasileiros representaram apenas 1 em cada 10 ingressos vendidos em 2023, contra 2 em cada 10 antes da pandemia.
No país, as grandes redes de cinema têm tentado estratégias para atrair o público de volta, como sessões a preços promocionais, festivais, upgrades de conforto e até pacotes que unem filmes a experiências gastronômicas. Mesmo assim, a pressão do streaming, com lançamentos simultâneos ou quase imediatos nas plataformas, tem afetado a presença do público.
Além disso, a Geração Z brasileira tem mostrado menor engajamento com a experiência do cinema tradicional, preferindo o acesso imediato via celular ou televisão. Especialistas apontam que o Brasil também precisa rever o modelo de distribuição e fortalecer políticas de incentivo à produção e exibição nacional.
E o futuro?
Apesar do tom alarmista de parte da indústria, muitos analistas brasileiros e estrangeiros defendem que o cinema não vai acabar, mas deve se transformar. O consenso é que o modelo atual precisará ser radicalmente reinventado para sobreviver nas próximas décadas, no futuro pode incluir salas menores, com experiências imersivas, eventos especiais com presença de artistas e estreias exclusivas em festivais ou espaços culturais.
O Brasil, com sua produção diversa e pública historicamente fiel à comédia e ao drama popular, ainda pode reinventar sua relação com o cinema de rua — mas isso exigirá inovação, investimento, diálogo com as novas formas de consumo cultural e barateamento ao acesso.